Após o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitar por unanimidade a denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e sete aliados por suposta tentativa de golpe de Estado, parte da oposição busca retomar a tramitação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que extingue o foro privilegiado. O texto, que tramita no Congresso desde 2013, ganhou novo fôlego após Bolsonaro defender a medida nesta quarta-feira (26), ao comentar sua condição de réu.
“Meu foro foi mudado há poucas semanas. Eu era primeira instância. Há poucas semanas, talvez um mês e pouco, mudaram”, disse o ex-presidente. “Eu acho que interessa pra muita gente aí essa PEC”, completou. Ele se referia a uma decisão do STF de 11 de março que ampliou o foro privilegiado para ex-detentores de mandato, mas o caso do suposto golpe já tramitava no tribunal antes da mudança.
O que diz a PEC e por que ela voltou ao debate?
A PEC em questão prevê que autoridades sejam julgadas em primeira instância por crimes comuns, eliminando o foro privilegiado – atualmente garantido a presidentes, governadores, parlamentares e outras autoridades, que têm processos analisados por tribunais superiores. A proposta foi aprovada no Senado em 2017 e passou por uma comissão especial na Câmara, mas aguarda votação em plenário.
A oposição, especialmente bolsonaristas, vê na PEC uma forma de retirar o caso de Bolsonaro da alçada do STF, em particular do ministro Alexandre de Moraes, relator do processo. O deputado Sanderson (PL-RS), vice-líder da Oposição, encaminhou um ofício ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-AM), pedindo a pauta da votação.
“Alguns parlamentares se amparam muito nesse foro privilegiado, mas eu sou contra qualquer privilégio. E, na minha avaliação, com o Supremo muito político, hoje [o foro privilegiado] mais atrapalha do que ajuda”, afirmou Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder do partido.
Casuísmo ou debate legítimo?
Enquanto a oposição defende a proposta como uma medida de igualdade perante a lei, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), acusa Bolsonaro de “casuísmo”.
“Ele passou quatro anos no governo e nunca se preocupou com essa PEC”, criticou Randolfe, que foi relator da proposta em 2017.
Juristas apontam que, se aprovada, a PEC poderia impactar processos em andamento, incluindo o de Bolsonaro. “A PEC, como é regra processual, vale para os casos em andamento, então afetaria o julgamento do Bolsonaro”, explicou o advogado criminalista Pierpaolo Bottini.
Apesar do interesse da oposição, a tramitação ainda enfrenta resistência no Congresso, onde muitos parlamentares veem no foro privilegiado uma proteção contra eventuais perseguições políticas. O desfecho da discussão pode definir não apenas o futuro da PEC, mas também o cenário jurídico de processos envolvendo autoridades no país.