Pouco antes de ser assassinado, o advogado Renato Nery, 72 anos, contou a uma testemunha que estava sofrendo ameaças, mas acreditava que seus algozes “não teriam coragem de matar outro advogado”, mencionando o caso de Roberto Zampieri, morto seis meses antes em Cuiabá. A informação integra o inquérito da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), que concluiu a primeira fase das investigações sobre o crime.
“Ele contou uma ameaça específica, para uma pessoa, uma testemunha, dias antes de morrer, que estava sendo ameaçado. E o que, de fato, se concretizou com a morte dele”, afirmou o delegado Bruno Abreu.
Apesar de ser o segundo advogado assassinado em pouco tempo, as autoridades afirmam que os casos não estão relacionados. O delegado titular da DHPP, Caio Albuquerque, reforçou que a única linha investigativa aponta para uma disputa por uma propriedade rural de grande porte. “Nós temos uma vítima que tinha uma única problemática, tá?”, disse.
Disputa judicial e denúncia na OAB
Cinco dias após o assassinato, veio à tona uma denúncia formal que Nery havia feito na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra o advogado Antônio João de Carvalho Júnior, acusando-o de irregularidades em uma disputa judicial por terras e de conluio com filhos de desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
No documento, de 26 páginas, Nery descreveu a atuação de Antônio João como parte de um “escritório do crime”, alegando que ele usava influência ilegal para manipular processos. “O Representado [Antônio João de Carvalho Júnior] pelo modo de agir, como ficará bem demonstrado, será levado ao opróbrio e em consequência a suspensão definitiva de suas atividades deverá ser proclamada pela Instituição”, diz um trecho.
O advogado assassinado também relatou que Antônio João o assediava por meio de um intermediário, inclusive quando ele estava doente (com COVID-19), pressionando-o a aceitar um acordo. “E assim o emissário agia, reiteradamente, sempre lhe advertia sobre a atuação do Des. Sebastião de Moraes, Relator dos Embargos que tinha rumo à Câmara Estendida, usando os seguintes termos: ‘ou faz acordo ou perde tudo'”, revelou o texto.
Investigação em sigilo
Questionado se Antônio João é investigado, o delegado Bruno Abreu manteve o sigilo: “Os alvos ainda sob investigação seguem em sigilo”.
Enquanto isso, a polícia trabalha com a hipótese de que o crime foi encomendado devido ao conflito fundiário. A perícia analisou 180 páginas de relatórios extraídos do celular de Nery, mas não encontrou outras motivações além da disputa judicial.
O caso segue em aberto, com a DHPP apurando possíveis intermediários e o pagamento aos executores. A expectativa é que novas prisões sejam feitas à medida que as provas forem consolidados.